sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Janelas






                    


                            Uma vez, um tempo, minha janela se abriu para um pátio onde havia um abacateiro, cujo morador da casa não deixava nunca que desse frutos. Quando o abacateiro conseguia ficar bonito, verde escuro e copado, lá vinha o morador e podava novamente dizendo que a árvore não produzia frutos e assim ficava a coitada se recuperando outra vez, com seus galhos cortados até que se tornasse linda e o morador viesse cortá-la sem dar-lhe tempo de produzir os frutos esperados.  Eu observava angustiada,  a luta  inglória daquela bela e pobre árvore.
                              Depois minha janela se abriu para um aglomerado de eucaliptos que se erguiam velozmente, dando a impressão que breve alcançariam o céu e aquelas árvores esguias e elegantes dançavam e cantavam  ao sabor dos ventos e formavam um contraste maravilhoso com o azul do céu.
                   Mais tarde minha janela se abriu para um pátio onde havia uma cadela que seguidamente aparecia com uma ninhada. Eu ficava observando os filhotes, suas brincadeiras, seus lamentos quando fazia frio ou chovia. Ficava observando aquelas vibrantes bolas peludas deslizando, rolando, caindo ladeira abaixo, enquanto a mãe observava com olhos atentos e preocupados.
                        Depois minha janela se abriu para o horizonte, onde os montes, picos, serras, montanhas, pareciam encostar no céu. Eu gostava de observar aqueles campos desdobrando-se, ondulados e curvilíneos, correndo ao encontro do céu.
                       Agora minha janela se abre para um pátio onde há um cinamomo e aí eu fico observando a exuberância de suas folhas no verão, a chuva dourada de folhas secas caindo, no outono, suas sementes  e galhos secos e desnudos no inverno e suas flores na primavera e seus galhos, às vezes, crescem tanto, se espicham e vêm espiar em minha janela, batem como se me chamassem pra conversar e nas noites de vento e frio esse chamado se torna mais urgente, mais violento. Eu a sinto minha, chamo-a "minha árvore". E aí as pessoas começam a falar que ela está ficando muito grande, que já está prejudicando, escurecendo o quarto, minha razão concorda, mas minha emoção discorda. E vem o dono do pátio podá-la e corta seus galhos que tombam deixando um espaço vazio  e claro;  olho o chão e vejo seus galhos tão garbosos  prostrados e logo perderão o viço, o verde, ficarão secos, mirrados, esturricados e eu fico triste olhando, sentindo saudade dos seus galhos, das suas batidas na minha janela, de mergulhar meus olhos naquele mistério escuro e verde; dói vê-la  caindo lentamente, mas olho pra baixo e vejo no tronco rente ao chão um brotinho verde e vivo, tremendo ao vento.