Sentada à mesa do café Fernanda pensa em sua vida, em sua
medíocre vida, naquele corre-corre infernal no escritório, naqueles números
dando nó em sua cabeça. Toma um gole de café, olha o relógio: 7 horas, daqui a
pouco estará sentada a sua mesa, soterrada em um monte de papéis, ouvindo
reclamações, cantadas, indelicadezas, mas terá que continuar a ser gentil, a
sorrir, a dizer: “as suas ordens”, “pois não”, “apareça sempre”, enquanto uma
tempestade agita sua alma, mas isso não importa, o que importa é o sorriso de
coquetel pendurado no rosto, torna a olhar o relógio: 7h10min. Os dias se
arrastam, se emendam, não sabe se ontem é hoje ou se hoje é amanhã, parece-lhe
que nunca sai dali, é uma rotina interminável e ao fim de cada dia dói-lhe o
corpo, dói-lhe a alma, faz um balanço da sua vida e não encontra nada que lhe
tenha dado prazer; 7h15min, é preciso sair, se chegar atrasada é reclamação que
não acaba mais. No apartamento vizinho, as crianças preparam-se para a escola,
pensa em como era bom o tempo que era criança e tinha mil sonhos a realizar,
agora está condenada a passar os dias trancafiada entre quatro paredes e a
única coisa interessante são os tipos que desfilam a sua frente e os próprios
colegas que mais parecem robôs andando de lá pra cá e de cá pra lá dizendo
“sim, senhor”, “pois não, senhor”, às ordens, senhor”, ou senhora, se for o
caso, é de enlouquecer; 7h20min; enquanto trabalha, observa; já fez um perfil
de todas as pessoas que trabalham com ela; a Ana vive inventando piadas pra ela
mesma rir, já que ninguém mais acha graça; a Tânia é a mulher fatal do
escritório, com roupas extravagantes, cheia de poses sensuais que copia das
artistas do cinema e da televisão, vive
se insinuando para os clientes e para os colegas e é famosa pelos seus
casos de amor. E a Fernanda? Bem, a Fernanda tenta achar um jeito de se
libertar dessa prisão, mas parece que
não está sendo muito capaz pra essa tarefa e além do mais tem que ficar se
equilibrando entre um assédio sexual ou psicológico. Que tortura! O Paulo é o galã,
dizendo galanteios, contando vantagens, acha que todas as mulheres vivem
correndo atrás dele e que é impossível resisti-lo; o André, esse tem mania de
geólogo, tudo que encontra na rua junta, amostras de terra, pedras, coisas
desse tipo; o chefe, o senhor Leôncio, esse é ridículo e se julga muito
interessante, muito culto e ninguém o suporta quando começa dar conselhos e
contar histórias da sua vida. 7h30min, é preciso ir, mas é tão difícil
enfrentar o dia-a-dia, é preciso fazer alguma coisa senão enlouquece, não
aguenta; e aquele cliente, o senhor Joaquim Pacheco, ah! Ele é tão engraçado
com aquela barriga enorme, querendo ser moderno para agradar as moças, como ele
diz e fala tanto , conta umas coisas bobas e jura que disse algo muito interessante;
o senhor Felipe, esse parece que ainda não percebeu que o tempo dos coronéis já
passou, chega falando grosso como se estivesse mandando e olha as mulheres como
se fossem objetos disponíveis e aquele bigode enorme que carrega o torna pior
ainda; o senhor Rodolfo adora se lamentar, nada dá certo, a plantação não deu,
o governo tá acabando com o agricultor, o tempo não ajuda, se está chovendo
acha que é preciso sol, se está fazendo sol, acha que tinha que estar chovendo;
o senhor Ari acha que tudo que é dele tem mais valor, o seu campo é o melhor, o
seu carro é o mais econômico, o mais potente, o mais bonito, não importa que os
outros sejam da mesma marca, mesmo
desing, o dele é único, a sua plantação
é a melhor que existe, o seu rebanho é uma seleção. Toma o último gole do café,
olha o relógio; 7h40min, pega a bolsa, se despede dos pais e dos irmãos e vai à
luta.
Eu.... Bom dia, Boa tarde, Boa noite, eu sou a MARIA ALTINA DE FARIAS e criei este blog para divulgar meus trabalhos literários desejando que façam com quem os lê o mesmo que a literatura fez comigo, alargando horizontes, abrindo janelas para um mundo de encantamento, sonho e reflexão, agitando águas interiores, provocando questionamentos, aguçando o sentido da vida, aprofundando a perspicácia e deixando a sensibilidade à flor da pele. Dói. Mas faz bem. Boa leitura...se conseguirem,
segunda-feira, 31 de março de 2014
terça-feira, 11 de março de 2014
O Mar e...Eu
A primeira vez que vi o
mar não fiquei impressionada nem fascinada.
Achei-o maravilhoso, é verdade, na sua
imensidão; fiquei observando suas águas agitadas e pensando: de quantas
tragédias, aventuras, vitórias e derrotas tu foste testemunha?
O céu de chumbo se refletia em suas águas e essa fusão mar-céu-mar me pareceu um gigantesco monstro cinzento
barrando meu caminho. Ele estava ali, na minha frente, como a dizer: Pára!
Gostei e não gostei dele. Sentia-me atraída e ao mesmo tempo reticente,
impotente diante dele.
Éramos um bando de colegiais em excursão e embora o mar estivesse
agitado não abrimos mão de fazermos uma pequena viagem a uma ilha próxima.
Durante a viagem ele se divertiu atirando sobre nós suas ondas impetuosas e arrogantes.
Ao retornarmos, no fim da tarde,
a nossa cidade, passamos pela
praia. Estava deserta. Estava um pouco frio e a beleza do momento era
inesquecível. As ondas vinham furiosas em direção à praia como se quisessem nos
alcançar e nos arrastar. Desatamos a correr pela praia juntando conchas. Éramos
indistintos pontinhos escuros agitando-se na areia branca. Quando voltamos
para o ônibus estávamos salgados e com as mãos cheias de conchas. Ele ficou lá
indiferente e soberbo.
Quando bem mais tarde voltei a vê-lo, foi como se chegasse a uma festa
em que o anfitrião não me tivesse notado. A tarde estava ensolarada, a praia
fervilhando de gente e ele estava ali fazendo parte daquilo tudo, sendo
envolvido e envolvendo(mais envolvendo).
O primeiro contato com suas águas
foi envolvente. Suas ondas vinham suaves rebentar na praia, mas eu sabia que
por trás desses abraços doces e ternos,
em suas profundezas escondia toda a fúria e força de que é capaz.
O céu de um azul puro mirava-se no
espelho de suas águas tornando-as azuis também e esse encontro de céu e mar
dava uma gostosa sensação de liberdade, vida, emoção. E eu gostei dele.
Mas o verdadeiro “encontro”
aconteceu uns dias mais tarde, numa noite em que fomos(eu e uns amigos) ver,
pela primeira vez, a Festa de Iemanjá, mas o que realmente vi foi o mar.
A praia estava movimentadíssima,
gente andando, falando, participando da festa, ou simplesmente assistindo, como
era o nosso caso. Mas emanava do mar um silêncio gostoso, uma tranquilidade,
uma sensação de independência e liberdade. De repente me pareceu que só
estávamos eu e ele, ali, naquela noite quente, em que as estrelas tomavam conta
do céu. Ele estava majestoso, único, importante. Imperturbável. Estava só, sem
se envolver nem envolver ninguém. Apenas ele
mesmo. Solitário no meio de tanta gente. Eu também estava acompanhada, com
muita gente a minha volta, mas solitária. Eu mesma, com meus pensamentos e
sentimentos. Não estava triste não, pelo contrário, estava feliz, mas vivendo
intensamente aquele momento de intimidade. Só meu. Meu, das estrelas, da noite
e...do mar.
Será que se eu falasse alguém
entenderia?
Aquele mar solitário,
imponente, me fascinava, mas eu sabia que ele podia ser terrivelmente perigoso
quando enfurecido.
Mas ele estava ali, tão ele
mesmo, tão MAR. E eu o amei.
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