domingo, 24 de fevereiro de 2013

Miragem




                - De onde és?
                - Miragem.
                Pronto. Passo a te incorporar, tudo que sou, que faço, tu és, tu fazes.
                É o que acontece sempre que viajo e as pessoas perguntam de onde sou.
                Parece que trago concentrado dentro de mim todo o teu amálgama. As personalidades mais opostas, os comportamentos mais diversos, os gostos mais extravagantes estão concentrados em mim.
                Represento-te minha cidade. Tudo que faço, falo, gosto, sou, tu fazes, falas, gostas, és.
                Se amo, tu amas; se não amo, não amas; se odeio, tu odeias; se não odeio, não odeias; se choro, tu choras; se não choro, não choras; se rio, tu ris; se não rio, não ris; se beijo, tu beijas; se não beijo, não beijas; se abraço, tu abraças; se não abraço, não abraças; se sou carinhosa, tu és carinhosa; se não sou carinhosa, tu não és carinhosa; se sou educada e simpática, tu és educada e simpática; se não sou educada e simpática, não és educada e simpática.
               Eu me sinto sufocada, oprimida sob o peso de uma responsabilidade que não é  só minha, afinal. És pequena, mas pra eu te carregar sozinha, és enorme. De repente, não sou mais a Marília, sou Miragem, chegam até a usar teu nome em lugar do meu ao se dirigirem a mim. E ficam querendo comparar tudo: onde é melhor? Aqui ou lá? Em Miragem se faz pães tão gostosos quanto os daqui? E café? E a água lá é tão boa quanto a nossa? E eu fico indefesa sob esse bombardeio de perguntas inconvenientes. Se respondo que tu és a melhor, falo a verdade, mas vão achar-me pretensiosa; se respondo que não, minto, além de te trair. Situação embaraçosa. Tenho sempre que achar um meio termo.
                Oh, Terrinha! Não exiges tanto desta tua filha.
                Não podem me olhar que lembram de ti. Falam que vão te visitar, quase esquecem de mim, pra só falarem de ti. Fico irritada, às vezes, sinto vontade de gritar.
                - Não sou Miragem...Sou Marília. Apenas Marília.
                Oh, Miragem, Miragem! Nosso relacionamento é um pouco passional. Te amo apaixonadamente, mas, às vezes, brigamos. Te sinto pequena demais, para o meu sonho, grande demais, talvez.
                Não me ofereces as oportunidades que quero e eu, quem sabe, não faço por ti tudo que mereces. Mas, mesmo assim, as brigas são passageiras. És tão encantadora! Teus montes, vales, lagos, teus campos, teu céu, teus pássaros, tua paz conquistam, atraem, encantam. E eu te amo muito.
             
              

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